Questionário

EDIÇÃO 238 – GABARITO

FATORES PRÉ-ANALÍTICOS INTERFERINDO NA DOSAGEM DE ELETRÓLITOS

A seguir são comentadas as questões para as quais foram recebidas mais dúvidas quando disponibilizadas para os usuários ControlLab

Pergunta 1: A resposta é a opção 1. Alguns elementos que estão presentes em concentrações elevadas nos eritrócitos podem alterar a concentração plasmática quando ocorre a hemólise da amostra. Dentre estes são descritos o potássio, o magnésio e o fosfato.

Pergunta 2: A resposta é a opção 4. Uma alteração na proporção correta sangue/aditivo pode resultar na hemólise de sangue, além da possibilidade de formação de coágulos quando o aditivo for insuficiente ou eventualmente uma diluição da amostra quando em excesso.

Pergunta 4: A resposta é a opção 4. O termo pseudo-hiponatremia é utilizado quando houver um quadro de hiponatremia com osmolaridade sérica normal ou elevada. Na hiponatremia verdadeira, a osmolaridade sérica é sempre baixa.

Pergunta 5: A resposta é a opção 2. Existem diversos fatores que podem influenciar no resultado da dosagem do cálcio ionizado, em particular, o pH da amostra. A ligação do cálcio a proteína e ânions é influenciada pelo pH “in vitro” e “in vivo”. A albumina é a principal proteína ligadora de cálcio. Uma elevação do pH numa amostra de sangue, tende a aumentar a ligação do cálcio à albumina com consequente queda no nível de cálcio ionizado. Já a diminuição do pH tende a elevar o nível de cálcio ionizado na amostra. Em razão da relação inversa entre pH e nível de cálcio ionizado, é importante que a análise seja realizada imediatamente após a coleta ou preservar a amostra de forma a evitar variação no pH.

Pergunta 6: A resposta é a opção 4. O anticoagulante EDTA é um quelante de cálcio sendo inadequada a sua utilização para coleta de amostras visando à dosagem do cálcio ionizado.

Pergunta 7: A resposta é a opção 2. Ao usar sangue total heparinizado para dosagem do cálcio ionizado recomenda-se o uso de heparina balanceada. A manutenção da estabilidade da amostra para dosagem de cálcio ionizado requer que o tubo seja mantido em condições anaeróbicas até o momento da dosagem. O cálcio ionizado tende a diminuir quando as amostras são expostas ao ar ambiente.

Pergunta 10: A resposta é a opção 2. As seringas específicas para coleta de gasometria e eletrólitos contém heparina (geralmente heparina de lítio) jateada na parede da seringa com balanceamento de cálcio, o qual tem por finalidade minimizar os efeitos da queda do cálcio ionizado na amostra.

Pergunta 12: A resposta é a opção 2. Amostras de sangue mantida à temperatura de refrigeração durante um período prolongado pode resultar na elevação do nível de potássio. Este fato deve-se a inibição da bomba de sódio-potássio e perda de potássio para o meio extra-celular.
Para dosagem de cálcio ionizado recomenda-se a refrigeração da amostra. As amostras de soro são estáveis por 24 horas em condições anaeróbicas à temperatura de 40º C.

Pergunta 14: A resposta é a opção 4. Ânion gap e base excess não são termos sinônimos. Define-se o termo ânion gap como sendo a diferença entre os íons de carga positiva e os de carga negativa presentes no organismo. Base excess ou excesso de base é o parâmetro que sinaliza o excesso ou déficit de bases dissolvidas no plasma sanguíneo.

Pergunta 15: A resposta é a opção 1. Quando a amostra de sangue total coletada em seringa para realização da gasometria é mantida durante longo período à temperatura ambiente, ocorre a queda gradativa do pH decorrente da glicólise que ocorre principalmente nos leucócitos, plaquetas e reticulócitos. A heparina não é um inibidor glicolítico e, portanto, não é um inibidor da glicólise.

Comentários Adicionais

Cálcio Ionizado

A dosagem do cálcio ionizado é realizada pelo método do eletrodo íon seletiva (ISE), sendo a análise passível de ser realizada em sangue total ou soro. Atualmente, a grande maioria dos analisadores de gases sanguíneos está capacitada a dosar o cálcio ionizado, concomitantemente com outros eletrólitos, tais como sódio, potássio e cloro, em amostras de sangue total.

Existem alguns fatores que podem influenciar no resultado da dosagem do cálcio ionizado e necessitam ser controlados para garantir um resultado consistente com o quadro clínico do paciente, conforme descritos a seguir:

• Efeito do pH: A ligação do cálcio a proteína e ânions é influenciada pelo pH “in vitro” e “in vivo”. A albumina é a principal proteína ligadora de cálcio. Uma elevação do pH numa amostra de sangue, tende a aumentar a ligação do cálcio à albumina com consequente queda no nível de cálcio ionizado. Já, a diminuição do pH tende a elevar o nível de cálcio ionizado na amostra. Estima-se uma variação de aproximadamente 5% para cada 0,1 unidade de alteração no nível de pH da amostra. Em razão da relação inversa entre pH e nível de cálcio ionizado, é importante que a análise seja realizada imediatamente após a coleta ou preservar a amostra de forma a evitar variação no pH.
• Requisitos da amostra: A dosagem de cálcio ionizado pode ser realizada em sangue total coletada com heparina, plasma heparinizado ou soro. É importante que a amostra coletada em seringa ou tubo de coleta seja mantida selada, e aberta somente no momento da análise para se evitar a perda de CO2, fato que resultaria na elevação do pH. As amostras devem ser processadas no menor intervalo de tempo, visando minimizar os efeitos da glicólise induzidos pelo metabolismo anaeróbico dos eritrócitos e glóbulos brancos.
• Preservação da amostra: Idealmente as amostras de sangue total para análise do cálcio ionizado deveriam ser processadas num intervalo de até 30 minutos, a semelhança da análise dos gases sanguíneos. As amostras coletadas em tubos e centrifugadas para obtenção de soro ou plasma mantêm-se estáveis durante algumas horas à temperatura de 25oC, e por vários dias à temperatura de 4oC desde que mantidas seladas.

Causas de variação pré-analítica na dosagem do cálcio ionizado:

• Atividade física: exercícios físicos moderados podem elevar os níveis de cálcio ionizado. Este efeito estaria relacionado à diminuição do pH e do bicarbonato, e a elevação do lactato, albumina e cálcio total observada durante a atividade física.
• Postura: a mudança de postura pode afetar os níveis das proteínas no sangue, a concentração das moléculas ligadas às proteínas, bem como a concentração dos íons de baixo peso molecular. Essa alteração ocorre pela saída do líquido dos vasos, pelo aumento do tônus muscular e pela pressão hidrostática.
• Alimentação: após as refeições pode ocorrer uma redução temporária de cerca de 5,4% no nível de cálcio ionizado. Diversos fatores poderiam estar contribuindo para este fenômeno, tais como:

– Aumento do pH sanguíneo;
– Elevação na concentração das proteínas no sangue;
– Elevação nas concentrações de bicarbonato e fosfato.

Todos estes fatores estariam contribuindo para aumentar a formação de complexos de cálcio com a albumina e outros íons.

• Ventilação: a alcalose respiratória pode diminuir a concentração de cálcio ionizado em 0,2 mg/dL ou 0,05 mmol/L, a cada 0,1 unidade de aumento no pH.
• Variação circadiana: o cálcio ionizado pode variar ao redor de 4 a 10% ao longo do dia. Isso se deve possivelmente aos seguintes fatores: alimentação, variação do equilíbrio ácido-básico e do sono.

Potássio
A falsa elevação do potássio sérico é comumente observada no laboratório clínico decorrentes de interferentes ou erros na fase pré-analítica.

Fatores relacionados à coleta de sangue:

• Erro na identificação da amostra (exemplo: troca de etiquetas).
• Tempo de garroteamento além de um minuto induzindo a hemoconcentração e/ou hemólise.
• Construção do músculo do antebraço com liberação do potássio pelas fibras musculares.
• Fricção do antebraço do paciente, para provocar a estase venosa induzindo a liberação do potássio pelas fibras musculares.
• Condições que podem resultar na hemólise:

– Não aguardar a evaporação completa do antiséptico;
– Utilização de agulhas de diâmetro inapropriado. O calibre da agulha deve ser compatível ao tamanho da veia;
– Coleta com seringa;
– Excessiva força para aspirar a amostra;
– Transferência da amostra para tubo à vácuo;
– Mistura vigorosa.

• Não respeitar a ordem correta para coleta de tubos.
• Não formação de uma barreira uniforme de gel após a centrifugação.
• Coagulação insuficiente e permanência de células acima da barreira de gel após a centrifugação.

Fatores relacionados ao processamento da amostra e transporte:

• Demora no transporte e processamento amostra resultando na liberação de potássio pelas células.
• Hemólise por agitação excessiva do tubo durante o transporte no tubo pneumático.
• Velocidade excessiva de centrifugação induzindo hemólise.
• Temperatura elevada de centrifugação induzindo hemólise.
• Temperatura de armazenamento: Temperaturas mais baixas (inferiores a 15ºC) inibem a glicólise e diminui a atividade da bomba de sódio e potássio resultado liberação do potássio das células. Temperaturas acima de 30ºC por 24 horas também elevam os níveis de potássio na amostra.

Fatores relacionados aos pacientes:

• Trombocitose: Durante o processo de coleta, as plaquetas liberam pequena quantidade de potássio na proporção de 0,7 mmol/L por 1.000.000/μL de plaquetas.
• Pseudohipercalemia familiar: liberação de potássio através da membrana do glóbulo vermelho quando o sangue é armazenado à temperatura ambiente, sendo este um distúrbio autossômico dominante.

Sódio

A hiponatremia é um distúrbio hidroeletrolítico mais comumente observado em pacientes hospitalizados. A hiponatremia pode ser definida como uma concentração de sódio sérico abaixo do limite inferior da normalidade. Diante de um paciente com hiponatremia, a primeira medida deve ser afastar uma pseudo-hiponatremia. Na hiponatremia verdadeira, a osmolaridade sérica é sempre baixa. Se houver hiponatremia com osmolaridade sérica normal ou elevada, está ocorrendo uma pseudo-hiponatremia. Estas situações não representam distúrbios no metabolismo da água e não necessitam de medidas direcionadas para correção do sódio sérico.

Pseudo-hiponatremia com osmolaridade sérica elevada

A situação mais clássica é a hiperglicemia, mas pode ocorrer também durante a administração de contraste iodado hiperosmolar. Neste caso, ocorre saída de água do líquido intracelular para o extracelular numa tentativa de equilibrar a osmolaridade entre os dois espaços. Esta entrada de água no líquido extracelular dilui o nível de sódio plasmático.

Pseudo-hiponatremia com osmolaridade plasmática normal

É descrita nas hiperproteinemias, como ocorre no mieloma múltiplo e nas hipertrigliceridemias, quando a fração aquosa do plasma está reduzida à custa de excesso de proteínas ou lípides.

Eletrólitos e Gasometria

Os equipamentos que realizam a análise dos gases sanguíneos permitem a dosagem concomitante de eletrólitos, visando avaliação conjunta do equilíbrio ácido básico e eletrolítico.
Na coleta de gasometria o documento do CLSI C46-A – Blood Gas and pH Analysis Related Measurements; Approved Guideline recomenda o uso de seringas plásticas preparada com anticoagulante apropriado, preferencialmente, a heparina liofilizada. A seringa pode ser mantida à temperatura ambiente, por no máximo 30 minutos após a coleta.

A análise deve ser realizada no menor intervalo de tempo possível. À temperatura ambiente, o pH pode diminuir devido à glicólise anaeróbia que ocorre nas células sanguíneas, liberando elementos ácidos.

Em relação ao anticoagulante, a melhor opção é utilizar uma seringa previamente preparada com heparina de lítio jateada na parede, com “balanceamento” de cálcio. Esse tipo de material é facilmente obtido no mercado e apresenta uma relação custo/eficiência satisfatória.

O uso de seringa, de preparação “caseira”, utilizando heparina líquida com “baixa concentração” de sódio aumenta a possibilidade de interferência na dosagem de cálcio iônico, pois existe a possibilidade da heparina ligar-se quimicamente ao cálcio, resultando em valores falsamente mais baixos do que o real.

A introdução do cálcio em concentração “balanceada”, nas seringas destinadas especificamente para coleta de gasometria e eletrólitos, tem por finalidade minimizar os efeitos da queda deste íon na amostra. A heparina líquida, em excesso, pode ainda causar diluição da amostra, resultando valores incompatíveis com a situação clínica do paciente. As seringas específicas para a análise de gases sanguíneos, além de eliminarem o risco de diluição da amostra, asseguram a proporção exata entre volume de sangue e anticoagulante, evitando assim a formação de micro-coágulos que podem produzir resultados errôneos, bem como obstruir os equipamentos analisadores de gases sanguíneos.

Após a obtenção da amostra arterial ou venosa despreza-se a agulha, esgota-se o ar residual, veda-se a ponta da seringa com o dispositivo ocluso e homogeneiza-se suavemente, rolando-a entre as mãos. A posição preferencial da seringa durante o transporte é a horizontal, pois facilita a homogeneização da amostra previamente a análise e minimiza a sedimentação das hemácias.

Ânion gap

Define-se o termo ânion gap como sendo a diferença entre os íons de carga positiva e os de carga negativa presentes no organismo, segundo a fórmula:
Ânion gap = Na+ – (Cl– + HCO3–)

O intervalo de referência varia de 8 a 16 mmol/L, sendo que o valor representa a concentração de todos os ânions não medidos no plasma. As proteínas carregadas negativamente constituem a maioria dos ânions que não são considerados no cálculo do ânion gap, além dos ânions de ácidos, como por exemplos o lactato e o acetoacetato produzidos na acidose metabólica.

Uma variação da fórmula clássica inclui o K+ no cálculo, sendo:
Ânion gap = (Na+ + K+) – (Cl– + HCO3–)

A principal utilidade do cálculo do ânion gap é auxiliar na caracterização de um quadro de acidose metabólica, onde os valores encontram-se elevados.

Gabarito

Pergunta 1 – Opção 1
Pergunta 2 – Opção 4
Pergunta 3 – Opção 2
Pergunta 4 – Opção 4
Pergunta 5 – Opção 2
Pergunta 6 – Opção 4
Pergunta 7 – Opção 2
Pergunta 8 – Opção 4
Pergunta 9 – Opção 2
Pergunta 10 – Opção 2
Pergunta 11 – Opção 1
Pergunta 12 – Opção 2
Pergunta 13 – Opção 4
Pergunta 14 – Opção 4
Pergunta 15 – Opção 1

Elaborador: Nairo M. Sumita. Professor Assistente Doutor da Disciplina de Patologia Clínica da Faculdade de Medicina USP. Diretor do Serviço de Bioquímica Clínica da Divisão de Laboratório Central – HC – FMUSP. Assessor Médico em Bioquímica Clínica – Fleury Medicina e Saúde. Consultor Científico do Latin American Preanalytical Scientific Committee (LASC) e membro do “specimencare.com” global editorial board. Diretor Científico da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial (SBPC/ML).

Referências Bibliográficas:

ANDRIOLO. A. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da UNIFESP – EPM. 2ª ed. São Paulo: Manole, 2008.

BURTS, C.A.; ASHWOOD, E.R.; BRUNS, D.E. Tietz Textbook of Clinical Chemistry and Molecular Diagnostics. 5th ed. St. Louis: Elsevier Saunders, 2012.

CLINICAL AND LABORATORY STANDARDS INSTITUTE(CLSI/ NCCLS). Blood Gas and pH Analysis and Related Measurements; Approved Guideline-Second Edition. CLSI/NCCLS document C46-A2 Vol.29 Nº8 (Replaces C46-A Vol.21 Nº14). Wayne, PA USA:NCCLS, 2009.

Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial para Coleta de Sangue Venoso. 2009. Disponível em: www.sbpc.org.br

Stankovic, A.K. Elevated serum potassium values. Am.J.Clin Pathol 2004. 121 (Suppl 1): S105-S112.

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